Por vezes achamos que o sorriso é um simples esgar ou um gesto reflexo dos músculos da cara para preencher uns segundos e dizer em silêncio: “está bem”.
Mas o sorriso é provavelmente o abraço mais caloroso e reconfortante que podemos oferecer. É o espelho mais fiel do nosso coração e dos nossos olhos... é o beijo que não damos mas queremos dar, é toda uma enciclopédia de sentidos.. é um dicionário de amores e carinhos que resumimos naquele momento.
A minha tia Idilia tinha um dom... o dom de amar e de sorrir de uma forma especial. A idade separava-a da minha mãe (sua única irmã) mas o coração mantinha o cordão umbilical tão próximo como se de gémeas perfeitas fossem. Uma tinha, a outra tinha. Uma sentia, a outra também... uma sofria, a outra pressentia.
A vida foi dura com a minha tia e o destino tentou roubar-lhe por tantas e tantas vezes a felicidade e a razão de viver... e ela sempre respondeu com este sorriso... o sorriso do tamanho do amar em hipérbole.
Perder duas filhas de forma trágica na flor da juventude, perder a mãe ainda nova, perder o irmão ainda novo, perder depois o pai... as doenças que se acumulavam, o retornar de África, o recomeçar... o trabalhar no duro... a tudo isto respondia com um sorriso único é tão belo de coragem e bravura. E tanto lhe doía lá dentro.
Acho que nunca a vi triste durante muito tempo. Tinha esse cuidado. Guardava com um “egoísmo” carinhoso e caridoso as mágoas só para si para poder oferecer sempre o seu sorriso.
Todos os anos da minha infância e adolescência tinham reservado no calendário uma semana, nas férias grandes, em Coimbra, em casa dela.
Foi por causa dela e dos outros tios de Coimbra (Manel e Fátima) que me apaixonei por Coimbra. A magia que a Solum tinha para mim e os “Patinhas e Donalds” que me comprava na pequena livraria do bairro, nos prédios ao lado. As minhas aventuras na piscina ao lado do estádio do Calhabé.... as idas à baixa com ela e o tio Fabião.
Mais tarde, quando se mudou lá para cima, na ladeira da Santiva... aquela paisagem mágica sobre Coimbra, a “velha cabra” (o relógio da torre da universidade)a fazer-se ouvir lá na colina.
Era tudo tão perfeito quanto o seu sorriso fazia parecer.
Os seus beijos, os abraços, os mimos, os carinhos e aquele jeito tão mágico de ser.
A serenidade do seu rosto só comparável ao da minha mãe e da minha avó Maria (a mãe delas) fazia-me sentir numa espécie de paraíso perfeito demais para um miúdo de 9, 10 ou 11 anos.
A vida foi-lhe dura... tão dura... mas ela sempre respondeu da mesma forma... não levantava a voz, não perdia a postura... não mostrava as lágrimas... apenas sorria.
Sorria com um coração tão grande, capaz de abraçar o mundo inteiro no regaço quente e reconfortante de quem nasceu para amar todo o universo.
Eu não sei se vocês acreditam no céu, em Deus ou noutra coisa qualquer. Mas eu tenho a certeza que, se houver alguma coisa de bom para lá desta vida, a Tia Idilia está lá de certeza, agora ao lado do tio Fabião, a sorrir e pronta para amar o mundo.
Já não tenho os dias da Solum, nem o fim de tarde na varanda na ladeira da Santiva... tenho o sorriso e o conforto que sinto cada vez que percorro aquela cidade e sempre que fecho os olhos e repito: “Amo-te tanto tia. Obrigado por me teres feito crescer assim e ensinado que o sorriso é sempre a perfeita conjugação do verbo amar.”
Obrigado Marco, estar a ler as tuas palavras, é estar a ler os meus pensamentos, partilho tudo isso que viveste e experenciaste de uma forma ainda mais proxima. Um grande abraço!
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